terça-feira, 8 de maio de 2012

Felicidade Hedonista



Não a quero. Na realidade nem sei se posso dizer se hoje esta é uma opção... Na dinâmica em que os olhos medem as cenas, fatos e projeções que escapam do ângulo escolhido pela forma homogênea de ver o mundo, a vida, creio não serem possiveis, senão reduzidas, as minhas opções, restando vivenciar e sentir à flor da pele, a felicidade de forma simples e maneira objetiva, que também é capaz de causar dor e estragos, em momentos que tem lá sua importância, arrancando lágrimas, desespero e sofrimentos, fazendo cicatrizes salutares para cada etapa de nosso caminhar...

Creio já poder considerar heróicos, os julgamentos de quem ousa sentir o mundo e a vida na sua existência plena, sem privar de sentir as inscrições do bem e do mal, do êxtase e da dor em sua plenitude. Quando a vida nos prega certas propagandas, tornando às vezes cômico, o que por ventura nos faria chorar, não seria motivo para contestarmos a razão insolente e frenética, que nos acorrenta ao prazer?  Saudades, distância, carência, amores não correspondidos, sentidos que na pele fere, sente, arde, ver e são hoje justificativas para a existência de produtos que aliviam a dor, ainda que esta esteja na alma... Como fugir disso?

Entre outras fábulas, frases, sensações e mitos, o existir é desenhado e nos faz por vez, coadjuvantes de nossa própria história, isso tudo em momentos efêmeros de um tempo curto, que se reduz a cada dia. Suplantamos nossas perdas e (re)significamos nossas distâncias, nesta cultura moderna que torna possível, embora virtual as relações e com elas o sentir, o que por vez alivia um âmago sedento, mas deixa no acúmulo e no fundo, nulo, oculto de cada ser, uma espessa e resistente a solidão que nos engole e fagocita...

Sentidos e sentimentos se tornam clichês, que impedem o expor-se-me de si para si, de mim para si de mim para mim. Ver hoje gestos e posturas sinceras se materializar em direção ao que faz, bem ou mal ao coração e ao existir, é sem dúvidas um achado... rsrsrsrsrsrsrs, e que pena... Penso, e também sinto que vivemos um tempo de anestesias, onde ser transparente e temer ser leviano com o próximo são posturas que requer ousadia, e também forças para romper com os padrões hegemônicos do engessamento social/sentimental. Hora penso ser um equívoco aceitar determinadas orientações para meu percurso particular, por sentir que minha personalidade se infecta com interessantes nostalgias vãs, mas resisto as paixões e as atraentes tentações deste tempo.
Felicidade simples, limpa e saudável...
Garimpar, sedimentar, compartilhar companhias saudáveis, que remetem a felicidades simples, que não exigem muito a se materializar, senão gestos e olhares é uma boa saída que me faz sentir bem, vivo, humano. Perceber-se-me leve em presenças outras, sem temor ou armaduras pode ser parâmetro e sinal de distanciamento desta felicidade hora pregada...

Confesso que apesar de todos os esforços temo a delicadeza, em especial a que faz de pessoas rosas flores, em estágio final de seu ciclo de vida, onde basta, um simples toque ou sopro, para que as pétalas se desmanchem ao chão... Isso me segura há momentos curtos e felicidades pontuais, mas que para mim, inegavelmente é melhor que esta sensação eterna de satisfação, que paira nos cartazes e faces das pessoas nas redes virtuais... As músicas ajudam a perceber tudo isso, e são grandes companheiras, ensaiadas junto o casal de violões que levo como parceiros de jornada. Também são pontes que aproximam minhas lembranças no Sertão, que doente,sente, imberna, e requer olhares sinceros e medidas exatas de antídotos outros, que revelem a realidade nua e crua, possibilitando o bom combate às muitas violências tecidas contra o Cerrado...
Da janela, o céu do Sertão e seu tapete... O Cerrado
  Os livros como drogas, também são fonte de soro, para recarregar a água que seca da nascente existencial de minha personalidade sertaneja... Tenho tomado doses cada vez maiores, que tem me levado a mergulhos profundos, alucinações e histerias, que por hora me curam, e por hora me matam... Ainda não sei ao certo, conferir os já impactos de todas as decisões tomadas pela minha mente, refletida em meu corpo, exercitada pela união dos dois, mas posso antecipar que há um misto condescendente de dúvidas e certezas que me faz às vezes raso, às vezes profundo em demasia, em especial para com as relações, trânsitos, sentimentos e sensações que se montam ao meu redor, embora cultive com zelo, a verdade do que posso e não posso oferecer...


Por este e outros, próximos e distantes se justifica o  combate a felicidade hedonista


Não desejo mais ser leviano com o coração alheiro, por isso preocupo conter expectativas que não posso cumprir, ainda que viva intensamente tudo que posso, seja por meio de ligações, textos e emails, seja qualquer outra coisa em qualquer outro lugar, como incita o Djavan, pois sei que no fim e no fundo o que fica são coisas boas e sinceras e sabores violentos, que para a distância e solidão me são remédios...


Sobre a felicidade e suas reverberações, tenho lá hoje, meu modo particular de a perceber e sentir... Já me sinto imerso a esta forma/outra mais reduzida, embora julgue também mais sincera e distante, de acessar a felicidade, como democraticamente boa parte à faz. A cada investimento conferido em prol de minha liberdade intelectual, que tem lá seu preço, me distancio mais dessa comum forma de ser feliz, e aumento meu arsenal particular... Não consigo/permito mais me anestesiar diante tamanhas incoerências, e antagonismos que eu mesmo produzo, impedindo-me de alcançar a plenitude dessa felicidade hedonista que se desenvolve diante meus olhos e que são para muitos a busca central da vida... 

Não consigo e não quero deixar de ver, as tantas injustiças, as muitas violências, físicas e simbólicas que minha geração e as que antecederam a minha, podem visualizar, diagnosticar, conferir, vir como torrente anestesiando cada vez mais, e em doses mais fortes, as novas gerações que dividem a sociedade hoje. Por estes, outros e alguns particulares fatos, devo concordar que felicidade é uma escolha, e eu escolho Ver e Sentir... Ainda que por ela venha também a dor... Prefiro-a que viver/estar anestesiado das verdades e realidades deste tempo...

Livros, contas e aromas, combustível aditivado para os meus pensamentos férteis

Fernando Pessoa, um amigo e refúgio, alivia-me das tensões e angústias, em dias como hoje, onde a fé é assaltada pela razão do existir. Incita o poeta que "Enquanto não atravessarmos a dor de nossa própria solidão, continuaremos a nos buscar em outras metades. Para viver a dois, antes, é necessário ser um"... Creio que esse exercício é, pois, para mim, remédio para o momento... Não necessariamente é preciso excluir algumas coisas para viver outras, mas necessariamente é preciso viver certas coisas para depois viver outras, ou, aceitamos nos condenarmos a andar os caminhos pela metade. Podemos ser inteiros, sem as dosagens certas da vida que propomos para nós?


Felicidade hedonista não. Não a quero, não a posso...

2 comentários:

  1. "Aqui ou noutro lugar, que pode ser feio ou bonito. Se nós estivermos juntos haverá um céu azul"...

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  2. Profundamente filosófico, nego... Senti o peso daqui. Abraço grande!

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